domingo, 4 de outubro de 2009

Esperaria a tua resposta por um milênio inteiro
conquanto não ficasse exposta
minha carne diante do Sol,
do vento e da chuva qeu me condena.
Ficaria qual um tolo, burro:
chacotado pelos transeuntes,
ao sentar no meio-fio
e lá servir de alvo às pombas.
Os camelôs me trariam água,
os gatos algum consolo.
As senhoras gordas, segurando fartas bolsas
me surrariam, abrindo
uma chaga nas minhas costas.
Meus livros me fariam companhia
para que não perdesse o português,
assim como jornais de dias passados.
Essas crianças desprovidas de folclore
até fariam um ciranda ao meu redor:

"Se eu tivesse um namorado,
mil beijos teria dado.
Se eu tivesse um noivinho,
beijava com mais carinho.
Se eu tivesse um marido,
dois filhos já tinha tido.
Se eu tivesse um poeta,
tacava-lhe uma panela."

Ficaria imóvel feito árvore
contigenciando forças para lhe ver.
Ao lhe ter os olhos percorrendo a rua
em busca de um destino perdido
o coração pulsa brevemente.
Vem andando com passos torpes
porém ritmados, a boca cantarola
uma canção feliz de nosso tempo,
escuto-a com um pavor suplicante
de uma memória esquecida.
O vento alija a pele, gelando
o suor de nervoso.
A proximidade rasgava-me
a úlcera em meu estômago.
Quando ela chega, pára.

Os dois se olham com a ausência
de mais de milênio.
Ela o esquecera no meio-fio.
Ele se comprometera a esperar.
Os segundos eram muitos
e ficaram se olhando
num deslumbre falso da realidade
esquecida de que amava.
Amara alguém, mas quem seria?
Ele tinha como recordar
o que fizeram juntos e as imagens
se repetiam feito projeção na retina.
E ficaram se olhando
quem seria este rapaz?
Deu meia-volta e partiu como veio.

Ainda calado, resolveu sentar-se
e esperar, talvez, outro milênio.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Fica um pensamento inerte ao céu
do fim da noite sob a Lua.
Sobretudo o silêncio cego
dos falsos amores
que reverbera no peito.


Fica uma vontade intensa de chorar
por um caminho sem rumo,
na direção da existência,
onde não se sabe
como o corpo repousar.

Fica em lágrimas a escuridão plena
de um vazio solitário
sem ao menos falar com a rosa,
a partida de um amor
para bem longe, depois do mar.

Fica a alma dançando nas ondas
que quebram forte na ressaca
se transforma em espuma esparsa
desfeita na areia seca
mas gerada pela água salgada.

Fica, enfim, em lirismo da vida:
do limiar do início
que se encontra no fim
e não aama ninguém
para poder viver só.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Poética

Acorda amor, que lhe mostro
sem cautela e prescrição
uma poesia ululante,
uma poesia sem conservante.
Ela grita o tempo,
a digestão dos fatos,
as pessoas nas ruas,
o amor infindo,
o beijo e o sorriso.

Sobretudo a despedida.

Ela pede calma.
A precisão do aconchego
é muita e meu coração
condescendente à paixão.
Uma paixão leve
do brilho nos olhos.

Lê uma poesia
sem data de validade,
que seja intermitente
e tenha o sabor dos séculos:
um amarelado de tempo
sem que, no entanto, cheire
ao mofo da estratosfera lírica,
nem seja previsível
e imediata nos sentidos.

sexta-feira, 31 de julho de 2009

Tira, Deus, as crianças
deste imenso purgatório.
As crianças que vagam por aí,
dobrando esquinas,
cantando a elegia da vida
que passam o dia inteiro
cheirando cola.

Tira as pequeninas almas
que quase de tudo já viram
para seus corpos
tão frágeis e franzinos.
Até mesmo o homem
mais perverso, talvez não vira
as horas sem comer,
os ratos por entre as pernas
e a morte do maninho
e o sumiço do pai.

Tira, Deus, pois o resto todo
esqueceu desses humanos.
Deixaram um bebÊ desfraldado
sozinho no chão da carioca,
ele não tem nome,
ele não tem cara,
ele não é nada.

quarta-feira, 29 de julho de 2009

João e o pé-de-feijão

O negócio é comer feijão,
No vagão do trem se espremer
E gritar com a dona do lado
Reclamando das sacolas.

É chegar na Central e comer

1 SALGADO
+
1 REFRESCO
=
R$ 1,50

E beber num pé-sujo sujo,
E correr, correr bem
Quando todos já correm.
É pegar a fezinha e torcer
Porque talvez se abrace o jacaré.
É comprar bugigangas
Que brotam da rua
Depois da guarda passar.
No final do dia
Correr para ver
O último trem do ramal santa cruz
Partir e correr, correr bem
Para entrar no vagão.
É chegar em casa a tempo
De ver toda novela.
Desligar a televisão,
Deitar na cama
Virar-se para elogiar a macarronada,
E dar aquele trato na patroa.
Amor proletário-revolucionário.
O negócio é comer feijão
E ser feliz!

Soneto do desolado

Este poeta caminha em círculos
pensativo, calado! Não se esgota
nem repara se sua coluna entorta
mas continua com uns passos ridículos.

Levanta as mãos aos céus e diz: “mas como?”
Pára, fecha a cara para o horizonte
esperando vir um rinoceronte
achando que aquilo seria um sonho.

Não é o caso de poeta platônico
nem de ela ter coração canônico.

Porém, tendo em vista, sua aplicação

ao poemar versinhos cheios de afeição
tomba o poeta ao ver, desolado,
que seu amor sequer fora notado.


Soneto da provocação

O que fazes em mim para perder
as palavras num soneto puro,
que certamente não tremer
o que isola teu coração: um muro?

Tão resistente que fico incapaz
de submetê-lo a minha poesia
atenuado fico, perco a paz
em não lhe dar, deste modo, alegria.

Porque não me olhas quando eu chego
e quando eu vou embora, me procuras?
Se por mim não há nenhum apego,

Porque me dizes as tuas aventuras?
E eu que fico aqui poemando
só posso achar que estás me provocando.

terça-feira, 28 de julho de 2009

O início

Sempre fui muito reticente, no entanto vamos ver no que vai dar este Blog.